Prova de leitura – Vidas Secas


Esta é uma atividade referente à leitura do livro Vidas Secas de Graciliano Ramos. Este livro é trabalhado, geralmente, no terceiro ano do Ensino Médio. É importante saber que Graciliano Ramos é o principal ficcionista da literatura brasileira da década de 1930, que se caracterizou pela temática social, focalizando, entre outros, aspectos concernentes ao Nordeste brasileiro, como a seca, o coronelismo e a exploração. Essa tendência recebeu o nome de neorealismo nordestino. Ao mesmo tempo, os autores da época continuaram a proposta modernista de uma literatura de resgate da linguagem coloquial. O romance Vidas Secas, publicado em 1938, consegue a proeza de apresentar de maneira sintética uma visão da sociedade brasileira em seus níveis mais profundos. Há a dimensão social da exploração e da opressão política. Há a dimensão psicológica da repressão, fazendo surgir indivíduos marcados pela introspecção. E há, por fim, a dimensão natural da seca, flagelo nordestino. A narrativa se relaciona a um período particularmente complicado da política brasileira e mundial. No Brasil, estava em vigor a ditadura Vargas, enquanto a Europa vivia as tensões que resultariam na eclosão da 2ª Guerra Mundial.

Atividade sobre o livro Vidas Secas

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Pouco a pouco o ferro do proprietário queimava os bichos de Fabiano. E quando não tinha mais nada para vender, o sertanejo endividava-se. Ao chegar a partilha, estava encalacrado, e na hora das contas davam-lhe uma ninharia.
Ora, daquela vez, como das outras, Fabiano ajustou o gado, arrependeu-se, enfim deixou a transação meio apalavrada e foi consultar a mulher. Sinhá Vitória mandou os meninos para o banheiro, sentou-se na cozinha, concentrou-se, distribuiu no chão sementes de várias espécies, realizou somas e diminuições. No dia seguinte Fabiano voltou à cidade, mas ao fechar o negócio notou que as operações de Sinhá Vitória, como de costume, diferiam das do patrão. Reclamou e obteve a explicação habitual: a diferença era proveniente de juros.
Não se conformou: devia haver engano. Ele era bruto, sim senhor, via-se perfeitamente que era bruto, mas a mulher tinha miolo. Com certeza havia um erro no papel do branco. Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu os estribos. Passar a vida inteira assim no toco, entregando o que era dele de mão beijada! Estava direito aquilo? Trabalhar como negro e nunca arranjar carta de alforria!
O patrão zangou-se, repeliu a insolência, achou bom que o va­queiro fosse procurar serviço noutra fazenda.
Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou. Bem, bem. Não era preciso barulho não. Se havia dito palavra à toa, pedia desculpa. Era bruto, não fora ensinado. Atrevimento não tinha, conhecia o seu lugar. Um cabra. Ia lá puxar questão com gente rica? Bruto, sim senhor, mas sabia respeitar os homens. Devia ser ignorância da mulher, provavelmente devia ser ignorância da mulher. Até estranhara as contas dela. Enfim, como não sabia ler (um bruto, sim senhor), acreditara na sua velha. Mas pedia desculpa e jurava não cair noutra.
O amo abrandou, e Fabiano sai de costas, o chapéu varrendo o tijolo. Na porta, virando-se, enganchou as rosetas das esporas, afastou-se tropeçando, os sapatões de couro cru batendo no chão como cascos.
Foi até a esquina, parou, tomou fôlego. Não deviam tratá-lo as­sim. Dirigiu-se ao quadro lentamente. Diante da bodega de seu Inácio virou o rosto e fez uma curva larga. Depois que acontecera aquela miséria, temia passar ali. Sentou-se numa calçada, tirou do bolso o dinheiro, examinou-o, procurando adivinhar quanto lhe tinham furtado. Não podia dizer em voz alta que aquilo era um furto, mas era. Tomavam-lhe o gado quase de graça e ainda inven­tavam juro. Que juro! O que havia era safadeza.

Graciliano Ramos, Vidas Secas

1. Pouco a pouco o ferro do proprietário queimava os bichos de Fabiano. A forma verbal queimava, no período em destaque, apresenta o sentido de:

A) ignorava.
B) assava.
C) destruía.
D) marcava.
E) prejudicava.

2. O texto, no seu conjunto, revela que Fabiano

A) ousou enfrentar o branco provando-lhe que as contas dele es­tavam erradas.
B) ao perceber que era lesado, defendeu com êxito seus direitos.
C) conscientizou-se de que era vítima de safadeza, e conseguiu justiça.
D) concluiu que era explorado na venda do gado e nas contas.
E) indignou-se com sua situação, mas voltou às boas com o pa­trão.

3. A respeito de Sinhá Vitória, a mulher de Fabiano, e possível afirmar que

A) tinha miolo, não errava nas operações e tentava atenuar os conflitos do marido com o patrão.
B) era mesmo ignorante; quando Fabiano percebeu seu erro, foi pedir desculpas ao patrão.
C) além de errar nas contas, irritava-se com a diferença dos juros.
D) suas contas sempre diferiam das do patrão, mas ela pedia a Fabiano que se conformasse.
E) era o único apoio do vaqueiro, mas infelizmente sua ação não tinha efeito.

4. Uma personagem constantemente mencionada em Vidas Secas, de Graciliano Ramos, é Seu Tomás da bolandeira. Homem letrado, é tido como um exemplo de "sabedoria" por Fabiano, que muitas vezes o vê como um modelo.

Em horas de maluqueira Fabiano desejava imitá-lo: dizia pala­vras difíceis, truncando tudo, e convencia-se de que melhorava. Tolice. Via-se perfeitamente que um sujeito como ele não tinha nascido para falar certo.
Seu Tomás da bolandeira falava bem, estragava os olhos em cima de jornais e livros, mas não sabia mandar: pedia. Esquisitice um homem remediado ser cortês. Até o povo censurava aquelas maneiras. Mas todos obedeciam a ele. Ah! Quem disse que não obedeciam?

a) Cite um episódio do romance em que fica evidente a dificulda­de de expressão de Fabiano, na presença de pessoas que julga superiores.

b) Como o episódio escolhido por você exemplifica a relação, percebida por Fabiano, entre um uso mais "difícil" da lingua­gem e o poder exercido por determinadas pessoas?

5. Em Vidas Secas, após ter vencido as dificuldades: postas no início da narrativa, Fabiano afirma: "Fabiano, você é homem...". Corrige-se logo depois: "Você é um bicho, Fabiano”. Em seguida, encontrando-se com a cadelinha, diz: "Você é bicho, Baleia".

Ao chamar a si mesmo e a Baleia de "bicho", Fabiano estabelece uma identificação com ela. Na leitura de Vidas Secas, podem-se perceber vários motivos para essa identificação. Cite dois desses motivos.

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