Você sabe o que é um clichê?


ESTUDANTE-PRODUTIVONada arruina tanto uma narrativa quanto o uso dos chamados clichês, lugares-comuns ou estereótipos. E como reconhecê-los? Usados numa redação, os chamados clichés empobrecem-na a ponto de torná-la vulgar, sem nenhum dado criativo. É fácil reconhecer os chamados clichês: eles são formados a partir de expressões muito desgastadas, ouvidas cotidianamente ou lidas em textos cujo valor é pequeno. Se as aceitamos ou, pior, passamos a fazer uso delas, corremos o risco de fazer de nosso texto um amontoado de palavras distantes de qualquer intensidade maior.

Muitas vezes, o clichê se apresenta também sob a forma de ideias que se desgastaram. Ou seja: tecer um texto a partir de uma ideia velha, antiga e repetida nem sempre vale a pena. Um exemplo disso são as novelas de tevê, sobretudo as que chamamos "mexicanizadas", cujos temas são sempre os mesmos, redundantes e repetitivos, sem que nada acrescentem ao nosso universo intelectual.

Talvez pela ausência da banalidade, mesmo que distantes séculos de nós, é que os grandes escritores, como Shakespeare, por exemplo, continuem vivos. É que eles criaram histórias distanciadas do convencionalismo barato.

Clichês: um perigo para as narrativas

Tomadas as palavras de Sartre, é preciso reinventar o mundo para estar vivo. Aliás, Cecília Meireles também disse isso mais explicitamente: "A vida só é possível reinventada.". Já aprendemos, nos capítulos anteriores, que escrever é reinventar o mundo. Mas de que jeito?

Texto 1 – Reinvenção

A vida só é possível reinventada.
Anda o sol pelas campinas e passeia a mão dourada pelas águas, pelas folhas... Ah! tudo bolhas que vêm de fundas piscinas de ilusionismo... —mais nada.
Mas a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.
Vem a lua, vem, retira as algemas dos meus braços. Projeto-me por espaços cheios da tua Figura. Tudo mentira! Mentira da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcanço... Só - no tempo equilibrada, desprendo-me do balanço que além do tempo me leva. Só - na treva, fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.

(Cecília Meireles)

Um dos perigos de todo texto narrativo é o uso reiterado do clichê. Ele o empobrece, tornando-o escasso em valor literário, fazendo com que o leitor encontre no que foi escrito o lugar-comum obtido de maneira fácil, muitas vezes resvalando - outro perigo! - num pieguismo frouxo. Examine os dois fragmentos abaixo:

1.   "A   ninguém   queria.   Além   do   pai.    Uma intransigência de cactus, deserto era a zona aflita do seu corpo. Buscou no início compreender. A dificuldade de amar fácil, como planta aceita delicada   o   crescimento.   Mas   as   plantas terminaram amor proibido, embora as quisesse. Colaborava com seu vicejar, para que cumprissem a perfeição da forma. Marta assoprava e dizia: onde está o teu capricho, planta ? E parecia-lhe que também, como ela, a planta crescia frondosa, de segredos intangíveis. Comovia-a o crescer sem deformações excedentes. Se ao menos fosse pássaro, proclamou perto do rio. "

(Nélida Piiion, A Casa da Paixão, F. Alves, 1988)

2.   "Ela não amava ninguém, só amava o pai. O corpo era seco como um deserto, um corpo que não compreendia. E cultivava plantas lindas e viçosas,   aguando-as   sempre  para   que   se tornassem maravilhosas. Perguntava a elas por que eram tão bonitas. Ela também fora sempre bela como um pôr-do-sol ou como o nascer da alvorada. Não tinha defeitos físicos, esperava um príncipe encantado que a tomasse nos braços e a fizesse feliz. As maçãs de seu rosto eram delicadas e seu perfume era suave como o de uma rosa recém-aberta ".

(Recriação do texto anterior)

Entendeu agora o que é clichê?

É o lugar-comum, imagem desgastada de tanto ser usada ("bela como o pôr-do-sol"/ "nascer da alvorada"/ "príncipe encantado que a tomasse nos braços e a fizesse feliz..."). Há um outro nome com o qual designamos o lugar-comum: estereótipo.

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