Lista de exercícios sobre Realismo e Naturalismo


Esta é a primeira lista de exercícios sobre Realismo e Naturalismo que publico aqui e, assim, inicio os artigos sobre Literatura. Compreender o pensamento artístico é fundamental para compreender também como pensa o homem e a sociedade na qual ele vive. Além dos muitos exercícios de  Sintaxe que você pode encontrar em nosso site, caso seu interesse seja pelo assunto deste psot apenas, convido você para conhecer alguns artigos que publiquei lá no site Mais Educativo.

Guia do participante do Enem
 
Lista de exercícios com gabarito

Textos para o exercício 1

Texto I

É um moço que ainda não chegou aos trinta anos. Tem uma fisionomia tão nobre, quanto sedutora; belos traços, tez finíssima, cuja alvura realça a macia barba castanha. Os olhos rasgados e luminosos, às vezes, coalham-se em um enlevo de ternura, mas natural e extreme de afetação, que há de torná-los irresistíveis quando o amor os acende. A boca vestida por um bigode elegante mostra o seu molde gracioso, sem contudo perder a expressão grave e sóbria, que deve ser o órgão da palavra viril.
Sua posição negligente não esconde de todo o garbo do talhe, que se deixa ver nessa mesma retração do corpo. É esbelto sem magreza, e de elevada estatura.

José de Alencar. Senhora.

Texto II

Entretanto, o seu tipo franzino, meio imberbe, meio ingénuo, dizia justamente o contrário. Ninguém, contemplando aquele insignificante rosto moreno, um tanto chupado, aqueles pômulos salientes, aqueles olhos negros, de uma vivacidade quase infantil, aquela boca estreita, guarnecida de bons dentes, claros e alinhados, ninguém acreditaria que ali estivesse um sonhador, um sensual, um louco.
Sua pequena testa, curta e sem espinhas, margeada de cabelos crespos, não denunciava o que naquela cabeça havia de voluptuoso e ruim. Seu todo acanhado, fraco e modesto, não deixava transparecer a brutalidade daquele temperamento cálido e desensofrido.

Aluísio Azevedo. Casa de pensão.

1. Os Textos I e II apresentam dois perfis masculinos de diferentes romances de nossa literatura.
a) Compare os dois perfis.

b) A que estética se associa cada um deles?

2. Leia os comentários publicados a seguir e identifique-os de acordo com o seguinte código:

R-N: Realismo-Naturalismo;
R: Romantismo.

I) (   ) "...exaltam, sobretudo, os sentimentos contra o primado da razão e do espírito, descambando não raro para misantropia e o pessimismo".
II) (   ) "Consiste na subordinação por um lado, do estilo ao objeto narrado e por outro, de todos os elementos do conteúdo às circunstâncias da realidade".
Ill) (   ) ".. .é a anatomia do caráter. É a crítica do homem".
IV) (   ) "É a arte que nos pinta a nossos próprios olhos
para que saibamos se somos verdadeiros ou falsos, para condenar o que houver de mau na nossa sociedade".
V) (   ) "...ocultada natureza encontrou campo propício
na exuberante paisagem nacional..."
VI) (   ) "...retrata de preferência a vida contemporânea, o seu tempo".
VII) (   ) "A comoção chorosa, exclamativa, egolátrica, não
podia deixar de ser um estado passageiro porque anormal. A saúde coletiva havia de superá-lo".
VIII) (   ) "Sobre a nudez da verdade, o manto diáfano da fantasia".
IX) (   ) "Controlando a sua sensibilidade, ou acomodando-se à ciência, pôs luvas de borrachas e não hesitou chafurdar as mãos nas pústulas sociais e analisá-las com rigorismo técnico, mais de quem faz ciência do que faz literatura".
X) (   ) "O culto do diferente explica.a literatura confessional, em que o eu liricamente se exibe na singularidade dos sentimentos e da imaginação, como explica ainda o nacionalismo estético, a valorização do que distingue uma cultura regional de todas as outras, logo o apreço do tradicional e do popular".

Texto para o exercício 3

Sua amizade com o grumete nascera, de resto, como nascem todas as grandes afeições, inesperadamente, sem precedentes de espécie alguma, no momento fatal em que seus olhos se fitaram pela primeira vez. Esse movimento indefinível que acomete ao mesmo tempo duas naturezas de sexos contrários, determinando o desejo fisiológico da posse mútua, essa atração animal que faz o homem escravo da mulher e que em todas as espécies impulsiona o macho para a fêmea, sentiu-a Bom-Crioulo irresistivelmente ao cruzar a vista pela primeira vez com o grumetezinho. Nunca experimentara semelhante cousa, nunca homem algum ou mulher produzira-lhe tão esquisita impressão, desde que se conhecia! Entretanto, o certo é que o pequeno, uma criança de quinze anos, abalara toda a sua alma, dominando-a, escravizando-a logo, naquele mesmo instante, como a força magnética de um imã.

Adolfo Caminha. Bom-Crioulo.

3. A partir do fragmento lido, responda ao que se pede.

a) O texto é realista ou naturalista?

b) Justifique sua resposta, apontando uma característica predominante no texto.

4. Considerando a corrente realista-naturalista, responda:

a) Qual é a corrente filosófica predominante naquele período?

b) O que é Determinismo e qual sua influência na Literatura?

Texto para o exercício 5

Uma transformação, lenta e profunda, operava-se nele, dia a dia, nora a hora, reviscerando-lhe o corpo e alando-lhe os sentidos, num trabalho misterioso e surdo de crisálida. A sua energia afrouxava lentamente; fazia-se contemplativo e amoroso. A vida americana e a natureza do Brasil patenteavam-lhe agora aspectos imprevistos e sedutores que o comoviam; esquecia-se dos seus primitivos sonhos de tição; para idealizar felicidades novas, picantes e violentas, tornava-se liberal, imprevidente e franco, mais amigo de gastar que de guardar adquiria desejos, tomava gosto aos prazeres, e volvia-se preguiçoso, resignando-se, vencido, às imposições do sol e do calor, muralha de fogo com que o espírito eternamente revoltado do último tamoio entrincheirou a pátria contra os conquistadores aventureiros.
E assim, pouco a pouco, se foram reformando todos os seus singelos de aldeão português; e Jerônimo abrasileirou-se.

Aluisio Azevedo. O cortiço.

5. Esses dois parágrafos pertencem ao romance considerado como a obra-prima do Naturalismo brasileiro.

a) Explique a transformação operada na personagem Jerônimo, segundo as teorias científicas do século XIX.

b) Quem elaborou tal teoria?

6. Houve um momento na história da prosa ocidental em que o romance se transformou em peça comprobatória de uma tese pela qual se procurava demonstrar certa tendência da personagem: um comportamento, uma herança biológica, o poder condicionador do meio etc.

a) De que tipo de romance se trata?

b) Indique um romance, de preferência brasileiro, em que ocorre tal fato.

7. O Realismo na literatura brasileira faz um romance

a)  estritamente regionalista, focalizando tipos humanos.
b)  geralmente de cunho social e psicológico.
c)  basicamente de tese experimental, focalizando o patológico.
d)  normalmente documental da exuberância da natureza.
e)  primordialmente de costumes, voltando para o ambiente rural.

8. (FUVEST-SP) Em 1881 foram publicados dois romances importantes no Brasil, com os quais se inicia um novo movimento literário na prosa brasileira.

a) Quais são esses romances?

b) Com que movimento literário eles rompem?

9. (PUCCAMP-SP)

"Como ostentasse certa arrogância, não se distinguia bem se era uma criança, com fumos de homem, se um homem com ares de menino. Ao cabo, era um lindo garção, lindo e audaz, que entrava na vida de botas e esporas, chicote na mão e sangue nas veias, cavalgando um corcel nervoso, rijo, veloz, como o corcel das antigas baladas, que o Romantismo foi buscar ao castelo medieval, para dar com ele nas ruas do nosso século."

Neste trecho de Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, percebe-se que o autor:

a) deixou escapar, por vezes, em romances já nitidamente realistas, os últimos resquícios de uma filiação romântica, difícil de romper definitivamente.
b)  aproveitou-se de recursos estilísticos do Romantismo a que esteve filiado em sua primeira fase romanesca, para enriquecer a força expressiva dos romances da segunda fase.
c)  conservou a idealização romântica da figura do herói, mesmo em sua fase crítica e de ruptura com a geração anterior.
d)  usou o recurso da paródia para disfarçar, em seus romances realistas, uma simpatia implícita pelos mitos românticos.
e)  utilizou-se muitas vezes da sua perspectiva crítica em relação à geração precedente, para satirizar os mais caros mitos do Romantismo.

10. (PUCCamp-SP) Assinale o item em que se analisam corretamente os conceitos de Realismo e Naturalismo.

a)  São caminhos antagônicos, esteticamente falando. 0 primeiro deriva do segundo, mas a ele se opõe quando retoma atitudes de estilos e ideologias que marcavam o Romantismo.
b)  no Realismo, importava sobretudo a realidade urbana, com os tipos burgueses dominando a cena; no Naturalismo, importa a Natureza, a vida simples e bucólica do campo.
c)  São termos equivalentes, já que se referem ao mesmo fenômeno ou tendência artística: expressão subjetiva da realidade, captada nos detalhes que mais estimulam a imaginação.
d)  Realismo é um movimento genérico, denotando sobretudo uma reação anti-romântica e compromisso com a objetividade; Naturalismo é uma particularização científica e determinista do Realismo.
e)  São termos que se excluem: as ideias realistas defendiam o progresso do pensamento e as conquistas sociais; as ideias naturalistas tinham como base a nostalgia e a conservação de valores do passado.

11. (CEFET-MG) Todos os trechos abaixo apresentam características do Naturalismo, exceto:
a)  "...depois de correr meia légua, puxando uma carga superior às suas forças, caiu morto na rua, ao lado da carroça, estrompando como um besta."
b)  "As corridas até à venda reproduziam-se, transformando-se num verminar constante de formigueiro assanhado."
c)  "Morreu na esteirinha rota, abandonada de todos, como um gato sem dono. (...) Depois, vala comum. A terra papou com indiferença aquela carnezinha de terceira."
d)  "Pestana fez uma careta, dissimulou depressa, inclinou-se calado, sem gentileza, e foi para o plano, sem entusiasmo. Ouvidos os primeiros compassos, derramou-se pela sala uma alegria nova, os cavalheiros correram às damas, e os pares entraram a saracotear a polca da moda..."
e)  "As dores inexoráveis prosseguiam amiudadas, e a desgraçada, sem mais esperança, viu chegada a hora da maternidade. (...) Os porcos, sentindo-a, sossegada, precipitaram-se sobre os resíduos sangrentos, espalhados no chão. Sorveram o sangue e, na excitação da voracidade, arremessaram-se à criança que, às primeiras dentadas, soltou um grito forte, despertando a mãe."

12. (UEL-PR) O romance chamado "de tese", que de fato buscava provar alguma teoria, focalizava comportamentos doentios, situações miseráveis, a tudo explicado por razões biológicas ou por condições do meio social das personagens. O romance a que se refere o texto acima foi praticado por

a)  Joaquim Manuel de Macedo.
b)  Machado de Assis.
c)  Coelho Neto.
d)  José de Alencar.
e)  Aluísio Azevedo.

13. (FEI-SP) Leia atentamente:

l) "A segunda Revolução Industrial, o cientificismo, o progresso tecnológico, o socialismo utópico, a filosofia positivista de Augusto Comte, o evolucionismo formam o contexto sócio-político-econômico-filosófico-científico em que se desenvolveu a estética realista".
II)   "O escritor realista acerca-se dos objetos e das pessoas de um modo pessoal, apoiando-se na intuição e nos sentimentos".
III)   "Os maiores representantes da estética realista-naturalista no Brasil foram: Machado de Assis, Aluísio de Azevedo e Raul Pompéia".
IV)   "Podemos citar como características da estética realista: o individualismo, a linguagem erudita e a visão fantasiosa da sociedade".

Verificamos que em relação ao Realismo-Naturalismo está (estão) correta (s):

a)  apenas a I e II.
b)  apenas a I e III.
c)  apenas a II e IV.
d)  apenas alie III.
e)  apenas a III e IV.

14. (UNIRIO-RJ) Sobre o Realismo, assinale a afirmativa correta.

a)  O romance é visto como distração e não como meio de crítica às instituições sociais decadentes.
b)  Os escritores realistas procuram ser pessoais e objetivos.
c)  O romance sertanejo ou regionalista originou-se no Realismo.
d)  O Realismo constitui uma oposição ao idealismo romântico.
e)  O Realismo vê o Homem somente como um produto biológico.

15.  (MACK-SP)

"...enfatiza o aspecto materialista da existência, vendo o homem como um produto biológico, cujo comportamento é resultado da pressão do ambiente social e da hereditariedade psicofisiológica. O homem passa a ser encarado como um ser impulsionado pelos instintos (são frequentes as comparações com animais), que, por sua vez, são despertados pelas condições do meio social."

O trecho anterior expõe claras características da estética:

a)  romântica.                         d) barroca.
b)  simbolista.                         e) modernista.
c)  naturalista.

16.  (MACK-SP) Vários autores afirmam que a diferença entre Realismo e Naturalismo é muito sutil. Um dos trechos a seguir é claramente naturalista. Assinale a alternativa em que ele aparece.

a)  "Desesperado, deixou o cravo, pegou do papel escrito e rasgou-o. Nesse momento, a moça, embebida no olhar do marido, começou a cantarolar à toa, inconscientemente, uma cousa nunca antes cantada nem sabida..."
b)  "Enfim chegou a hora da encomendação e da partida. Sancha quis despedir-se do marido, e o desespero daquele lance consternou a todos."
c)  "Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro do café aquecia, suplantando todos os outros..."
d)  "Foi por esse tempo que eu me reconciliei outra vez com o Cotrim, sem chegar a saber a causa do dissentimento. Reconciliação oportuna, porque a solidão pesava-me, e a vida era para mim a pior das fadigas, que é a fadiga sem trabalho."
ê) "E enquanto uma chora, outra ri; é a lei do mundo, meu rico senhor; é a perfeição universal. Tudo chorando seria monótono, tudo rindo, cansativo; mas uma boa distribuição de lágrimas e polcas, soluços e sarabandas, acaba por trazer à alma do mundo a variedade necessária, e faz-se o equilíbrio da vida."

17.  Considere as seguintes afirmativas:

I) "Esforço-me por entrar no espartilho e seguir uma linha geométrica: nenhum lirismo, nada de reflexões, ausente a personalidade do autor." (Gustave Flaubert)
II) "Em Thérèse Raquin, eu quis estudar temperamentos e não caracteres. Aí está o livro todo. Escolhi personagens soberanamente dominadas pelos nervos e pelo sangue, desprovidas de livre-arbítrio, arrastadas a cada ato de sua vida pelas fatalidades da própria carne." (Émile Zola)

As afirmativas lidas aplicam-se, respectivamente, aos seguintes movimentos literários:

a) Romantismo e Realismo
b) Barroco e Arcadismo
c) Trovadorismo e Humanismo
d) Classicismo e Neoclassicismo
e) Realismo e Naturalismo

18.  (UEL-PR) Indique o trecho em que há visíveis marcas do estilo naturalista.

a) "O vulto da mulher, quase invisível à frouxa luz do luar, pareceu-lhe uma fantasmagoria, e seu coração bateu mais forte, ao compasso das ondas, da música do mar que chegava pelo vento..."

b)  "(...) tem tão bom céu e goza de tão bons ares toda a terra do Brasil, que nenhuma das causas que costumam fazer dano por outras regiões o fazem nela, nem cobram forças para o poderem fazer."
c)  "Quanta graça devemos à Fé que nos destes, porque ela só nos cativa o entendimento, para que, à vista destas desigualdades, reconheçamos contudo vossa justiça e previdência!"
d)  'Tremiam-lhe as carnes ao contato de um condutor elétrico, a distender-lhe os nervos escabujando na rede em espreguiçamentos lúbricos, vergando, como um vencido, ao poder irresistível da animalidade humana."
e)  "Na repartição, os pequenos empregados, amanuenses e escreventes, tendo notícia desse seu estudo do idioma tupiniquim, deram não se sabe por que em chamá-lo -Ubirajara."

19.  Assinale a alternativa em que a afirmação não se refere aos ideais que nortearam o Naturalismo nem a seus escritores.

a)  Da mesma forma que a máquina que produz vitríolo não é intrinsecamente melhor ou pior do que aquela que faz açúcar, também o homem mau está no mesmo plano que o homem bom: nenhum deles é responsável por aquilo que é, ambos foram condicionados por forças que estão além de seu controle.
b)  A amoralidade desses escritores resulta duma extensão à esfera moral do método científico da época, ou seja, da crença em que o historiador da vida humana e o observador científico dos fenômenos naturais têm tarefas paralelas, e, por conseguinte, utilizam métodos paralelos.
c)  O escritor trabalha como um médico, com a curiosidade do sábio apenas; envereda pelo estudo dum caso curioso de fisiologia, para produzir espécies anatômicas nuas e vivas, numa verdadeira atitude cirúrgica.
d)  Definia-se um desejo de individuação nacional, a que correspondia o de individuação pessoal: libertação graças à definição da autonomia estética e política e a conquista do direito de exprimir direta e abertamente os problemas pessoais.
e)  As personagens são concebidas de uma maneira peculiar: uma vez que a humanidade delas desapareceu e "a alma está em absoluto ausente", elas são "bestas humanas", dominadas pelos nervos e desprovidas de livre arbítrio.

20. (FATEC-SP) Um romance deve ser um espelho. (Sthendal) Tomando por base a frase de Sthendal, indique a época literária que usa espelhos planos. Justifique sua resposta.

Eça de Queirós

Texto para os exercícios de 21 a 23

Amaro abriu a vidraça. Ao fim da rua um candeeiro esmorecia. A noite estava negra. E havia sobre a cidade um silêncio côncavo, de abóbada.
Depois das cornetas, um rufar lento de tambores afastou-se para o lado do quartel; por baixo da janela, um soldado, que se demorara nalguma viela do castelo, passou correndo; e das paredes de Misericórdia saía constantemente o agudo piar das corujas.
— É triste isto - disse Amaro.
Mas a São-Joaneira gritou de cima:
— Pode subir, senhor cónego! Está o caldo na mesa!
— Ora vá, vá, que você deve estar a cair de fome. Amaro! — disse o cónego, erguendo-se muito pesado.
E detendo um momento o pároco pela manga do casaco:
— Vai você ver o que é um caldo de galinha feito cá pela senhora! Da gente se babar!...
No meio da sala de jantar, forrada de papel escuro, a claridade da mesa alegrava, com a sua toalha muito branca, a louça, os copos reluzindo à luz forte dum candeeiro de abat-jour verde. Da terrina subia o vapor cheiroso do caldo, e na larga travessa a galinha gorda, afogada num arroz úmido e branco, rodeada de nacos de bom paio, tinha uma aparência suculenta, de prato morgado. No armário envidraçado, um pouco na sombra, viam-se cores claras de porcelana; a um canto, ao pé da janela, estava um piano, coberto com uma colcha de cetim desbotado. Na cozinha frigia-se; e sentindo o cheiro fresco que vinha dum tabuleiro de roupa lavada, o pároco esfregou as mãos, regalado.

Eça de Queirós.

21. Sabendo que Eça de Queirós foi o introdutor do Realismo em Portugal, diga por que podemos considerar o texto transcrito como realista.

22. Como se trata de um trecho de obra muito conhecida, identifique, se puder, o romance ao qual o mesmo pertence. Assinale os elementos da identificação.

23. Indique mais três obras fundamentais de Eça de Queirós.

24. Ao criticar Oprimo Basílio, Machado de Assis afirmou:"(...) a Luísa é um caráter negativo, e no meio da ação ideada pelo autor, é antes um títere que uma pessoa moral." Títere é um boneco mecânico, acionado por cordéis controlados por um manipulador. Nesse sentido, as personagens que, principalmente, manipulam Luísa, determinando-lhe o modo de agir, são:

a)  Basílio e Juliana.
b)  Jorge e Justina.
c)  Jorge, Conselheiro Acácio e Juliana.
d)  Basílio, Leopoldina e Conselheiro Acácio.
e)  Jorge e Leopoldina.

25.  "Este livro é o introdutor do romance realista em Portugal. (...) A sociedade leiriense é o cenário, com serões da São-Joaneira. O protagonista (...) mantém relações íntimas com Amélia, e depois a abandona."

Esse comentário refere-se ao romance:

a)  O crime do padre Amaro, de Eça de Queirós.
b)  Oprimo Basílio, de Eça de Queirós.
c)  Primaveras românticas, de Antera de Quental.
d)  Viagens na minha terra, de Almeida Garrett.
e)  Amor de perdição, de Camilo Castelo Branco.

Texto para o exercício 26

Luísa espreguiçou-se. Que seca ter de se ir vestir! Desejaria estar numa banheira de mármore cor-de-rosa, em água tépida, perfumada e adormecer! Ou numa rede de seda, com as janelinhas cerradas, embalar-se, ouvindo música! (...) Tornou a espreguiçar-se. E saltando na ponta do pé descalço, foi buscar ao aparador por detrás de uma compota um livro um pouco enxovalhado, veio estender-se na "voltaire", quase deitada, e, com o gesto acariciador e amoroso dos dedos sobre a orelha, começou a ler, toda interessada. Era a 'Dama das Camélias'. Lia muitos romances; tinha uma assinatura, na Baixa, ao mês.

Eça de Queirós. O primo Basílio.

26.  Nesse excerto, o narrador apresenta duas características da educação da personagem Luísa que serão objeto de crítica ao longo do romance.

a)  Quais são essas características?

b)  Explique de que modo elas contribuem para o destino da personagem.

27.  A respeito de Eça de Queirós, responda:

a)  Qual sua importância na prosa da língua portuguesa?

b)  Quantas e quais são as fases em que se costuma dividir sua obra?

Texto para o exercício 28

Lembrou-se de que Amélia tinha ido passar a tarde com a Sra. D. Joaquina Gansoso, numa fazenda ao pé da Piedade, e que a S. Joaneira falara em ir à irmã do cónego. Fechou devagar a cancela, subiu à cozinha a acender o seu candeeiro; como as ruas estavam molhadas da chuva da manhã, trazia ainda galochas de borracha; os seus passos não faziam rumor no soalho; ao passar diante da sala de jantar sentiu no quarto de S. Joaneira, através do reposteiro, e pela porta entreaberta espreitou. - Oh Deus de Misericórdia! a S. Joaneira, em saia branca, atacava o colete; e, sentado à beira da cama, em mangas de camisa, o cónego Dias resfolegava grosso.

Eça de Queirós. O crime do padre Amaro.

28.  Nesse fragmento, o padre Amaro flagra o Cónego Dias na cama da São-Joaneira.

a) Quais são as consequências desse flagrante na vida de Amaro?

b) Em que medida esse episódio ilustra as teses do Naturalismo?

Texto para o exercício 29

Gostava muito da frescura de sua boca; fazia-se pálida à ideia de o poder abraçar na sua longa batina preta! Quando Amaro saía, ia ao quarto dele, beijava a travesseirinha, guardava os cabelos curtos que tinham ficado nos dentes do pente. As faces abrasavam-se-lhe quando o ouvia tocar a campainha.
Se Amaro jantava fora com o Cónego Dias, estava todo o dia impertinente, ralhava com a Ruça, às vezes mesmo dizia mal dele, "que era casmurro, que era tão novo que nem inspirava respeito". Quando ele falava de alguma nova confessada, amuava, com ciúme pueril. A sua antiga devoção renascia, cheia de um fervor sentimental: sentia um vago amor físico pela Igreja; desejaria abraçar, com pequeninos beijos demorados, o altar, o órgão, o missal, os santos, o Céu, porque não os distinguia bem de Amaro, e pareciam-lhe dependência de sua pessoa. Lia seu livro de missa pensando nele como no seu Deus particular.

Eça de Queirós. O crime do padre Amaro.

29. Levando em conta o texto, responda:

a) Quem é a personagem feminina focalizada pelo narrador?

b) Qual é o grau de envolvimento dela com o Pe. Amaro?

30. O crime do padre Amaro, primeiro romance de Eça de Queirós, foi publicado em 1875. Considerando essa obra:

a) Justifique seu título.

b) Quais as características do autor, presentes no romance, que seriam constantes na segunda fase de sua obra?

Texto para o exercício 31

Jorge foi heróico durante toda essa tarde. Não podia estar muito tempo na alcova de Luísa, a desesperação trazia-o num movimento contraditório; mas ia lá a cada momento, sorria-lhe, conchegava-lhe a roupa com as mãos trêmulas; e como ela dormitava, ficava imóvel a olhá-la feição por feição, com uma curiosidade dolorosa e imoral, como para lhe surpreender no rosto os vestígios de beijos alheios, esperando ouvir-lhe nalgum sonho da febre murmurar um nome ou uma data; e amava-a mais desde que a supunha infiel, mas dum outro amor, carnal e perverso. Depois ia-se fechar no escritório, e movia-se ali entre as paredes estreitas, como um animal numa jaula. Releu a carta infinitas vezes, e a mesma curiosidade roedora, baixa, vil, torturava-o sem cessar: Como tinha sido? Onde era o Paraíso? Havia uma cama? Que vestido levava ela? O que lhe dizia? Que beijos lhe dava?

Eça de Queirós. O primo Basílio.

31. (VUNESP-SP) No trecho apresentado, o narrador descreve as reações de Jorge, que vive num conflito íntimo entre a piedade e o ódio: tem de cuidar da esposa Luísa, muito doente, embora tenha sabido, pela leitura de uma carta, que ela o traíra com Basílio. Nestas poucas linhas se podem perceber várias características da ficção realista. Aponte duas delas.

Texto para o exercício 32

Brancas rochas, pelas encostas, alastravam a sólida nudez do seu ventre polido pelo vento e pelo sol; outras, vestidas de líquen e de silvados floridos, avançavam como proas de galeras enfeitadas; e, de entre as que se apinhavam nos cimos, algum casebre que para lá galgara, todo amachucado e torto, espreitava pelos postigos negros, sobre as desgrenhadas farripas de verdura, que o vento lhe semeara nas telhas. Por toda a parte a água sussurrante, a água fecundante... espertos regatinhos fugiam, rindo com os seixos, de entre as patas da égua e do burro; grossos ribeiros açodados saltavam com fragor de pedra em pedra; fios direitos de luzidios como cordas de prata vibravam e faiscavam das alturas aos barrancos; e muita fonte, posta à beira de veredas, jorrava por uma bica, beneficamente, à espera dos homens e dos gados...

32. Ao longo desse trecho de A cidade e as serras, Eça de Queirós se serve repetidamente da prosopopéia ou personificação, figura que consiste em atribuir a seres inanimados qualidades próprias de seres animados (particularmente qualidades humanas). Releia o trecho e explique o efeito expressivo das prosopopéias ou personificações na descrição das serras e de seus acidentes. Apresente uma passagem do texto para comprovar seu comentário.

33.  Segundo a opinião de Machado de Assis, em O primo Basílio, de Eça de Queirós, apenas uma personagem está bem realizada e convence o leitor pela estatura moral e pelo desempenho dentro do romance.

a) Dê o nome e a profissão dessa personagem.

b) Aduza elementos que justifiquem sua resposta.

34.  Assinale os itens que estejam cornetos, a propósito da obra de Eça de Queirós:

I) (   ) A cidade e as serras é um romance plenamente integrado na fase de demolição da moral burguesa.
II)  (   ) O primo Basílio registra um caso de bovarismo,
com adultério sendo a única saída para a mulher da alta sociedade portuguesa, que passa os dias no ócio, a sonhar e a ler romances sentimentalóides.
III)  (   ) Eça de Queirós deu o golpe de morte à frase oratória, tão cara ao ouvido peninsular, unindo as palavras em novos, sóbrios e sutis sistemas expressivos, capazes de insinuar no espírito do leitor ricas complexidades de experiência psíquica.
IV)  (   ) Os Maias, a mais bem acabada realização de Eça
de Queirós, é um romance que se desenvolve em duas linhas de ação: a primeira, em torno dos amores incestuosos de Carlos de Maia; a segunda, em torno da vida da alta burguesia lisboeta.
V)  (   ) Na última fase de sua obra, Eça abandona o ceticismo irônico em nome de uma perspectiva otimista, de exaltação aos valores tradicionais.

35. Os romances de Eça de Queirós costumam apresentar críticas a aspectos importantes da sociedade portuguesa, frequentemente acompanhadas de propostas (explícitas ou implícitas) de reforma social. Em A cidade e as serras:

a) qual o aspecto que se critica nas elites portuguesas?

b) qual é a relação, segundo preconiza o romance, que essas elites deveriam estabelecer com as classes subalternas?

Texto para o exercício 36

Nessa semana, uma manhã, Jorge, que não se recordava que era dia de gala, encontrou a secretaria fechada e voltou para casa ao meio-dia. (...) chegando despercebido ao quarto, surpreendeu Juliana comodamente deitada na chaiseiongue1, lendo tranquilamente o jornal (...) Jorge não encontrou Luísa na sala de jantar; foi dar com ela no quarto dos engomados, despenteada, em roupão de manhã, passando roupa, muito aplicada e muito desconsolada.
— Tu estás a engomar? - exclamou.
(...) A sua voz era tão áspera, que Luísa fez-se pálida, e murmurou:
— Que queres tu dizer?
— Quero dizer que te venho encontrar a ti a engomar, e que a encontrei a ela lá embaixo muito repimpada na tua cadeira, a ler o jornal.

Eça de Queirós. O primo Basílio.

* chaise-longue. cadeira de encosto reclinável e com lugar para estender as pernas.

36. (UNICAMP-SP)

a) No trecho citado são mencionadas três personagens: Jorge, Juliana e Luísa. Que relação há entre elas?

b) Considerando o trecho citado acima e a resposta dada ao item a, explique por que Jorge considera inadequado o comportamento das duas mulheres.

c) Analise a trajetória de Luísa e Juliana no romance, de modo a explicar a situação em que se encontram no trecho citado.

37. Personagem do romance O primo Basílio, de Eça de Queirós, tornou-se tão conhecida por suas intervenções, que seu nome deu origem a palavras dele derivadas como: acaciano, acacianismo, acacianamente. Assinalar a alternativa que explica o significado atribuído a estas palavras em função do Conselheiro Acácio:

a)   inesperadas declarações ou informações que dão novo rumo à conversa;
b)  afirmações irrefutáveis ou solidamente argumentadas;
c)   ironias profundas ou sutis ridicularizações imprevisíveis;
d)  trivialidades com feição sentenciosa ou gravemente ridículas;
e)  argumentação cerrada ou raciocínios cerebrinamente elaborados.

Texto para o exercício 38

— Diz que os colarinhos tinham pouca goma; pôs-se a despropositar! Estou farta de a aturar! Estou farta! Estou até aqui! - bradava, puxando a pele engelhada da garganta. - Pois que não faça sair de mim! Que me vou, pespego-lhe na cara por quê! Desde que aqui temos homens e pouca vergonha, boas noites!...

38.  (UNITAU-SP) Por se tratar de um romance de tese, em O primo Basílio há pistas e indícios conduzindo o raciocínio do leitor. Explique o que está latente na fala da empregada Juliana e que se realizará posteriormente.

39. (MACK-SP) Assinale a alternativa incorreta a respeito de Eça de Queirós.

a) Embora tenha militado intensamente na implantação do Realismo em Portugal, não participou das Conferências do Cassino Lisbonense.
b) Costuma-se dividir sua obra em três fases, sendo a segunda aquela em que desenvolveu um estilo realista implacável.
c) Sua obra é considerada o ponto mais alto da prosa realista portuguesa.
d) Em O crime do padre Amaro, critica a sociedade burguesa de Portugal e mostra a influência do clero na sociedade provinciana.
e) Em O primo Basílio, temos um romance no qual se denuncia a rede de vícios e de adultérios que infestava a Lisboa de então.

40. (FUVEST-SP) O primo Basílio pertence à fase dita realista de seu autor, Eça de Queirós. É reconhecido, também, como um romance de tese - tipo de narrativa em que se demonstra uma ideia, em geral com intenção crítica e reformadora. Tendo em vista essas determinações gerais, é correto afirmar que, nesse romance:
a) o foco expressivo se concentra na anterioridade subjetiva das personagens, que se dão a conhecer por suas ideias e sentimentos, e não por suas falas ou ações.
b) as personagens se afastam de caracterizações típicas, tornando-se psicologicamente mais complexas e individualizadas.
c) a preferência é dada à narração direta, evitando-se recursos como a ironia, o suspense, o refinamento estilístico de períodos e frases.
d) o interesse pelas relações entre o homem e o meio amplia o espaço e as funções das descrições, tornadas mais minuciosas e significativas.
e) a narração de ações, a criação de enredos e as reflexões do narrador são amplamente substituídas pelo debate ideológico-moral entre Jorge e o Conselheiro Acácio.

Texto para o exercício 41

A carruagem parou ao pé de uma casa amarelada, com uma portinha pequena. Logo à entrada um cheiro mole e salobro enojou-a. A escada, de degraus gastos, subia ingrememente, apertada entre paredes onde a cal caía, e a umidade fizera nódoas. No patamar da sobreloja, uma janela com um gradeadozinho de arame, parda do pó acumulado, coberta de teias de aranha, coava a luz suja do saguão. E por trás de uma portinha, ao lado, sentia-se o ranger de um berço, o chorar doloroso de uma criança.

Eça de Queirós. O primo Basilio

41.  (FUVEST-SP) Observando-se os recursos de estilo presentes na composição desse trecho, é correto afirmar que

a)  o acúmulo de pormenores induz a uma percepção impessoal e neutra do real.
b)  a descrição assume caráter impressionista, dando também dimensão subjetiva à percepção do espaço.
c)  as descrições veiculam as impressões do narrador, e o monólogo interior, as da personagem.
d)  a carência de adjetivos confere caráter objetivo e real à representação do espaço.
e)  o predomínio da descrição confere caráter expressionista ao relato, eliminando seus resíduos subjetivos.

42.  (MACK-SP) SUMA CIÊNCIA x SUMA POTÊNCIA

Esse ideal faz parte da filosofia de vida de importante personagem de Eça de Queirós. O mesmo pode ser encontrado em:

a)  O primo Basílio.
b)  O crime do padre Amaro.
c)  A cidade e as serras.
d)  Os Maias.
e)  A ilustre casa de Ramires.

Textos para o exercício 43

O exercício a seguir toma por base dois fragmentos: o primeiro, do romance Amor de perdição, do escritor romântico português Camilo Castelo Branco (1825-1890); o segundo, do romance Os Maias, do realista português Eça de Queirós (1845-1900).

Texto I

E Simão Botelho, fugindo à claridade da luz e ao voejar das aves, meditando, chorava e escrevia assim as suas meditações:
"O pão do trabalho de cada dia, e o teu seio para repousar uma hora a face, pura de manchas: não pedi mais ao céu.
Achei-me homem aos dezesseis anos. Vi a virtude à luz do teu amor. Cuidei que era santa a paixão que absorvia todas as outras, ou as depurava com o seu fogo sagrado.
Nunca os meus pensamentos foram denegridos por um desejo que eu não possa confessar alto diante de todo o mundo. Dize tu, Teresa, se os meus lábios profanaram a pureza de teus ouvidos. Pergunta a Deus quando quis eu fazer do meu amor o teu opróbrio.
Nunca, Teresa! Nunca, ó mundo que me condenas!
Se teu pai quisesse que eu me arrastasse a seus pés para te merecer, beijar-lhos-ia. Se tu me mandasses morrer para te não privar de ser feliz com outro homem, morreria, Teresa!"

Camilo Castelo Branco. Amor de perdição.

Texto II

Mas Carlos vinha de lá enervado, amolecido, sentido já na alma os primeiros bocejos da sociedade. Havia três semanas apenas que aqueles braços perfumados de verbena se tinham atirado ao seu pescoço - e agora, pelo passeio de São Pedro de Alcântara, sob o ligeiro chuvisco que batia as folhagens da alameda, ele ia pensando como se poderia desembaraçar da sua tenacidade, do seu ardor, do seu peso... É que a condessa ia-se tornando absurda com aquela determinação ansiosa e audaz de invadir toda a sua vida, tomar nela o lugar mais largo e mais profundo - como se o primeiro beijo trocado tivesse unido não só os lábios de ambos um momento, mas os seus destinos também e para sempre. Nessa tarde lá tinham voltado as palavras que ela balbuciava, caída sobre o seu peito, com os olhos afogados numa ternura suplicante: Se tu quisesses! que felizes que seríamos! que vida adorável! ambos sós!... E isto era claro - a condessa concebera a ideia extravagante de fugir com ele, ir viver num sonho eterno de amor lírico, nalgum canto do mundo, o mais longe possível da Rua de São Marcai! Se tu quisesses! Não, com mil demônios, não queria fugir com a Sra. condessa de Gouvarinho!...

Eça de Queirós. Os Maias.

43. (VUNESP-SP) Nos dois textos apresentados, as personagens Simão Botelho e Carlos comentam, em situações diversas e sob pontos de vista diferentes, suas respectivas relações amorosas. Releia-os e, em seguida:

a) indique uma característica romântica da abordagem do tema do amor no texto de Amor de perdição.

b) comente um aspecto do fragmento de Os Maias que, pelo seu caráter realista, contraria a abordagem romântica do tema do amor.

44. Um dos poemas mais populares da Literatura Portuguesa do século XIX foi "O noivado do sepulcro", de Soares de Passos. Trata-se da história de um casal de apaixonados que, depois de mortos, transformados em esqueletos, reencontram-se num cemitério. O final do poema é o seguinte:

E ao som dos pios do cantor funéreo,
E à luz da lua de sinistro alvor,
Junto ao cruzeiro, sepulcral mistério
Foi celebrado, dinfeliz amor.

Quando risonho despontava o dia,
Já desse drama nada havia então,
Mais que uma tumba funeral vazia,
Quebrada a lousa por ignota* mão.

Porém mais tarde, quando foi volvido
Das sepulturas o gelado pó,
Dois esqueletos, um ao outro unido,
Foram achados num sepulcro só.

Massaud Moisés. A literatura portuguesa através dos textos.

* ignota, desconhecida.

Algum tempo depois, Eça de Queirós faz uma referência curiosa a "O noivado do sepulcro". Por não ter sido escolhido para ocupar o cargo de cônsul na Bahia, ele escreve uma carta ao Ministério do Reino dizendo que os motivos pelos quais foi preterido nasceram de um preconceito literário. Lembre-se de que, em 1871, Eça havia proferido uma das Conferências do Cassino Lisbonense, defendendo "O Realismo como nova expressão da Arte". Eis um trecho da carta:

Porque enfim - se eu não posso ser cônsul por ter feito uma conferência - se essa conferência foi a condenação do romantismo, segue-se que eu não posso ser cônsul por ter condenado o romantismo.
Ora, realmente, eu não sabia que para ser cônsul - era necessário ser romântico! Eu não via, entre as habilitações que o programa requeria, esta: "Certidão do regedor que o concorrente recita todas as noites, ao luar, 'O noivado do sepulcro', do chorado Soares de Passos". Eu não sabia disto!

Álvaro Cardoso Gomes. "A ironia desnudando a sociedade". In Eça de Queirós.

Levando-se em conta a referência que Eça de Queirós faz ao poema de Soares de Passos, é correto afirmar que:

a) a citação de "O noivado do sepulcro" é casual, pois, se ele tivesse escolhido um poema de outro autor, como Camões ou Bocage, sua carta continuaria exatamente com o mesmo sentido.
b) Eça de Queirós está elogiando o poema de Soares de Passos, tomando-o como um exemplo da boa literatura romântica, muito admirada pelo público em Portugal.
c) "O noivado do sepulcro" está sendo visto de maneira pejorativa, já que representa um tipo de literatura - a romântica - que Eça de Queirós, como realista, queria superar.
d) a referência ao poema de Soares de Passos, apesar de irônica, mostra o apreço que Eça de Queirós tinha pelo Romantismo, movimento literário do qual ele nunca conseguiu verdadeiramente se desligar.
e) embora Eça de Queirós reconheça a importância de "O noivado do sepulcro", ele mostra como o Realismo se implantou, com enorme facilidade, em substituição ao Romantismo.

45. Que romancista brasileiro mais se aproxima de seu contemporâneo Eça de Queirós, quanto à concepção da literatura como instrumento de denúncia social?

Gabarito dos exercícios

1. a) O Texto I apresenta o perfil de uma personagem idealizada e perfeita, de porte altivo e nobre; o Texto II, um tipo franzino, feio e imperfeito.

b) O perfil delineado no Texto l é romântico; no Texto II, naturalista.

2.
I) R
II) R-N
III) R-N
IV) R-N
V) R
VI) R-N
VII) R
VIII) R-N
IX) R-N
X) R

3. a) O texto é naturalista.

b) A sexualidade, em todas as suas formas, é uma temática cara ao Naturalismo, que procura acentuar os instintos animais do ser humano.

4.
a)  É o Positivismo, de Augusto Comte. b) O Determinismo, de Hippolyte Taine, afirma que o comportamento humano é condicionado por três fatores: a herança genética, o contexto histórico e o meio ambiente, tal teoria foi empregada por vários autores, sobretudo os naturalistas, na construção de personagens e situações.

5. a) A transformação operada em Jerônimo pode ser justificada a partir do Determinismo. Influenciado pelo meio, o português vê pouco a pouco seus hábitos de aldeão português cederem lugar à brasilidade.

b) Hippolyte Taine.

6. a) Trata-se do romance realista-naturalista.

b) Tais características aplicam-se, por exemplo, ao romance O cortiço, de Aluísio Azevedo.

7. B

8. a)  Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis e O mulato, de Aluísio Azevedo.
b) Rompem com o movimento romântico.

9. E

10. D

11. D

12. E

13. B

14. D

15. C

16. C

17. E

18. D

19. D

20. Trata-se do Realismo propriamente dito. Seus criadores procuraram retratar a realidade com a máxima fidelidade e objetividade, assim como um espelho plano o faz.

21.   Pela visão objetiva da realidade, retratada com detalhes, e pela caricatura que o autor faz do personagem glutão.
22.   Trata-se do romance O crime do padre Amaro, conforme se pode perceber pelos personagens que  intervêm  na  cena: Amaro, São-Joaneira, Cónego Dias.
23.   O mandarim, A ilustre casa de Ramires, A relíquia.
24.   A
25.   A
26.   a) Passividade indolente e gosto pela literatura romântica.

b) O mundo de sonhos dos românticos, cheio de aventuras, incentiva Luísa a cometer adultério e sua indolência afronta Juliana, que a chantageia.

27.   a) Eça de Queirós foi o principal prosador português do século XIX e um dos mais importantes da Língua Portuguesa.

b) Em três fases: a primeira, de influência romântica, reúne seus escritos iniciais, que foram publicados posteriormente num volume chamado Prosas bárbaras; a segunda, mais radical, de franca influência realista/naturalista, inclui, entre outros, os romances O crime do padre Amaro e O primo Basílio-, a última, de realista maduro, pode ser identificada em romances como A cidade e as serras e A ilustre casa de Ramires.

28.   a) Amaro,  naquela ocasião,  sentia-se atraído por Amélia, filha de São-Joaneira, mas não dava vazão a seus impulsos, em função do voto de castidade que fizera ao se ordenar. 0 fato de ter flagrado o Cónego Dias na cama com a mãe da amada fá-lo sentir-se livre para dar curso à sua atração pela moça.

b) O episódio ilustra as teses naturalistas, que afirmam a superioridade do instinto e da sexualidade sobre a razão.

29.   a) É Amélia, filha de São-Joaneira, dona
da casa em que o padre Amaro vivia.

b) Amélia  tornar-se-á,   efetivamente, amante do padre Amaro.

30. a) Amaro quebra o voto de castidade e engravida Amélia que acaba morrendo em decorrência de complicações de parto; o recém-nascido é entregue a Dona Carlota, a "fazedora de anjos", que dava fim às crianças que ficavam sob seus cuidados.

b) A crítica feroz ao provincianismo e à hipocrisia da sociedade lusitana

31. A primeira característica notável no texto em questão está na análise psicológica. 0 autor espelha a angústia que perpassa no espírito de Jorge, e faz isso procurando detalhar, esmiuçar o conflito do marido em relação ao adultério da esposa. Outra característica realista está exatamente na descrição minuciosa e atenta de detalhes objetivos e subjetivos como, por exemplo: "e como ela dormitava, ficava imóvel a olhá-la feição por feição, com uma curiosidade dolorosa e imoral,". Um outro aspecto, ainda, consiste na abordagem naturalista que se revela na animalizaçao da personagem dominada por sentimentos tão contraditórios que vão do amor ao ódio: "como um animal numa jaula." Eça de Queirós procura realçar o comportamento deformado e hipócrita da sociedade lisboeta, que se apresenta como guardiã da moralidade, mas, na verdade, é presa fácil de impulsos que a reduzem à imoralidade. É o que o narrador flagra na passagem em que Jorge olha para Luísa "com uma curiosidade dolorosa e imoral".

32. Nesse fragmento de Eça de Queirós, a serra e os elementos da paisagem que a integram são descritos como seres animados, dotados de ação (as rochas avançavam, os regatos fugiam), de intencionalidade ("fonte à espera dos homens e dos gados") e de outras características próprias do ser humano (as rochas vestidas; a nudez do ventre das rochas). Dessa forma, a paisagem, que representa a natureza, não se apresenta como um objeto alheio ao homem, mas 'como um convivente, com o qual interage de maneira harmoniosa e cheia de prazer. A natureza, personificada por meio do recurso da pro-sopopéia, é concebida como um integrante do universo humano, numa relação empática. Exemplo: "Espertos regatinhos fugiam, rindo com os seixos, de entre as patas da égua e do burro."

33. a) O nome de tal personagem é Juliana (Couceiro Tavira). Sua profissão é a de empregada doméstica. A ela competiam todos os serviços caseiros, menos os de cozinha. Lavava, passava, engomava e cuidava da limpeza. Era a "criada de dentro", pois servia à mesa e tomava contato com os patrões e as visitas.

b) Machado de Assis, em crítica na revista O Cruzeiro, em 1878, considera as personagens de O primo Basílio criaturas sem força moral, isto é, sem densidade psicológica. Julga-as expressão da vontade do autor, que lhes atribui ações para cumprir os lances de uma intriga previamente estabelecida. Não surpreendem, porque o leitor, percebendo as linhas gerais do enredo, logo adivinha o que quer que venham a fazer. Uma personagem, no entanto, não se comporta dessa maneira. Trata-se de Juliana, que Machado considera "o caráter mais completo e verdadeiro do livro". Quando o enunciado da questão fala em "estatura moral", traduz uma ideia de Machado segundo a qual Juliana é a única personagem do romance que possui densidade psicológica. Machado considera que tal personagem recebeu uma alma, um conjunto de fatores caracterológicos dos quais decorrem suas ações. Ela não é uma personagem acabada, da qual sabemos tudo ou quase tudo desde as primeiras páginas. Ela convence e surpreende, porque evolui com o andamento da intriga. Não foi desenhada previamente pelo autor. A expressão "estatura moral", do enunciado, pode fazer pensar em bom comportamento ético, segundo os padrões da sociedade burguesa. Nesse sentido, poder-se-ia pensar na personagem Sebastião, que age com lealdade, respeitando os princípios éticos de sua classe. Mas ele também é uma personagem cujas ações estão sempre voltadas para a satisfação da intriga do romance. Não possui "estatura moral" enquanto criatura romanesca.

34. Estão corretos os itens II, III, IV e V.

35. a) O conservadorismo e a futilidade.

b) Relação assistencialista.

36. a) O romance Oprimo Basílio (1878), de Eça de Queirós (1845-1900), cujo subtítulo é "Episódios da vida doméstica", estrutura-se em torno da vivência do casal Jorge e Luísa, típica família pequeno-burguesa de Lisboa. Juliana é a criada que, sentindo-se explorada pelos patrões, cultiva um sentimento de rancor e revolta. Vivia sempre atenta aos movimentos da casa, na esperança de pilhar algum deslize moral dos patrões, de que pudesse tirar vantagem.

b) Jorge considera inadequado o comportamento das mulheres porque observa a nítida inversão dos papéis domésticos: a empregada Juliana está "comodamente deitada na chaise-lon-gue, lendo tranquilamente o jornal", enquanto a esposa Luísa está "no quarto dos engomados, despenteada, em roupão de manhã, passando roupa, muito aplicada e muito desconsolada".

c) À medida que Luísa se aprofunda na relação adúltera com Basílio, Juliana, que havia descoberto essa relação, procura tirar proveito dela. De posse de uma carta de Luísa ao amante, passa a chantageá-la. Acuada, Luísa submete-se à inversão dos papéis, a ponto de permitir o gesto atrevido da criada.

37. D

38. Está latente a vontade de Juliana de chantagear a patroa com as cartas de amor de que se apoderou.

39. A

40. D

Os chamados romances de tese, característicos do Realismo-Naturalismo, utilizam a trama e as personagens como símbolos ou expressões de uma ideia de caráter determinista. As personagens, nesse caso, têm de amoldar-se aos elementos gerais postulados pelo autor, e isso as torna psicologicamente pouco complexas. Uma das motivações centrais desses romances é a submissão às imposições do meio ambiente. Nesse caso, a pobreza da trama passa a ser comprovada pela estilização da linguagem, e esta pela exuberância descritiva.

41. B

A descrição impressionista não apresenta as coisas pelo registro objetivo de suas características, mas através da subjetividade do observador, que as transfigura segundo suas impressões psíquicas, despertadas por sua percepção sensorial. Assim, o cheiro é mole e salobro, a escada sobe apertada pelas paredes e a janela parece coar a luz.

42. C. Trata-se de Jacinto de Thormes.

43.   a) O tema do amor, no Romantismo, é geralmente marcado pelo sentimentalismo e pela idealização. Tais características podem ser identificadas de modo claro no fragmento de Amor de perdição. Simão Botelho, arrebatado pela emoção, não a esconde ("E Simão Botelho (...) chorava (...)"; "(...) a paixão que absorvia todas as outras (...)"). Mas seu sentimento não manifesta desejo físico ("Nunca os meus pensamentos foram denegridos por um desejo que eu não possa confessar diante de todo o mundo."): apresenta-se de forma espiritualizada, pura e sublime ("Vi a virtude à luz do teu amor. Cuidei que era santa a paixão que absorvia todas as outras, ou as depurava com o seu fogo sagrado."), capaz de levar um homem orgulhoso, como é o caso do protagonista, a se humilhar e a renunciar à própria vida para propiciar a felicidade da amada ("Se teu pai quisesse que eu me arrastasse a seus pés para te merecer, beijar-lhos-ia. Se tu me mandasses morrer para te não privar de ser feliz com outro homem, morreria, Teresa.").

b) No fragmento de Os Malas, o amor romântico da condessa de Gouvarinho provoca a aversão de Carlos, que se sente "enervado" pelos excessos sentimentais da mulher. Para o herói realista, "o primeiro beijo trocado" não passa de "um momento", um simples episódio físico sem maiores consequências; na perspectiva romântica da condessa, o beijo não seria a mera união dos lábios, mas o sinal da união de "seus destinos também e para sempre". Carlos considera o "sonho eterno de amor lírico" inaceitável, absurdo e extravagante. Ao repudiar o sentimentalismo e a idealização, ele contraria a abordagem romântica do amor e afirma, assim, a visão realista.

44. C

"O noivado do sepulcro" e sua história de amor entre esqueletos representam a vertente ultra-romântica de Portugal, que se pauta pelos exageros sentimentalistas. Muito popular, o poema tornou-se símbolo do idealismo amoroso próprio da época. Eça de Queirós, ao citar o texto de Soares de Passos, tem uma intenção claramente irónica, pois procura associá-lo a um tipo de manifestação artística já fora de moda. Insatisfeito com a não nomeação para.cônsul no Brasil, ele afirma que não foi escolhido para o cargo por não ser um escritor romântico, isto é, por não admirar a literatura que Passos representava. Com efeito, em 1871, Eça tinha participado das famosas Conferências Democráticas do Cassino Lisbonense, ciclo de palestras que pregou uma verdadeira revolução na cultura portuguesa. Além do Realismo literário, defendeu-se a modernização do país em sentido amplo. Esse impulso de modernidade das Conferências incomodava as parcelas mais conservadoras da sociedade, que ainda se identificavam com o Romantismo. Por isso, Eça de Queirós ironiza "O noivado do sepulcro", por acreditar que o poema simboliza uma forma literária ultrapassada e que precisaria ser superada.

45. Trata-se de Aluísio Azevedo, autor de O mulato. Casa de pensão e O cortiço, entre outras obras.

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